segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A próxima reforma da PAC

A próxima reforma da PAC (Política Agrícola Comum) da União Europeia




Em 11 de Junho de 2010 esteve na Feira da Agricultura de Santarém o Comissário Europeu para a Agricultura, Dacian Ciolos, a participar em debate sobre a próxima reforma da PAC (Política Agrícola Comum).
Pelo então dito, com ela procura-se que os agricultores preservem o meio ambiente, inovem actividades rurais e as diversifiquem, garantam a ocupação humana (emprego) e a preservação dos recursos naturais e da biodiversidade.

A PAC, política agrícola comum, foi criada pela CEE, pouco depois do seu início, para garantir a soberania alimentar dos países seus integrantes no caso de perturbação grave do comércio internacional. Para isso estabeleceram preços compensadores para os principais produtos agrícolas e a sua retirada do mercado se os agricultores os não conseguissem vender.
Esta política levou ao rápido aumento da produção agrícola e, depois, à produção de excedentes cuja exportação a CEE passou a apoiar com subsídios suficientemente elevados para os tornar competitivos no mercado mundial.
Seria de esperar que o crescente aumento das produções agrícolas levasse à reforma da PAC com diminuição dos preços garantidos. Mas a França e outros países opuseram-se.

Entretanto os países em vias de desenvolvimento contestaram a subsidiação pela CEE das exportações agrícolas dos países que a integravam para as tornar competitivas no mercado internacional, o que foi feito no âmbito do GATT (General Agreement on Trade and Tariffs), organismo internacional de comércio a que sucedeu a OMC (Organização Mundial do Comércio).
Para, sem reduzir os preços,  limitar a produção de excedentes, a reforma da PAC restringiu as principais produções agrícolas, fixando quotas, e deixou de garantir a sua retirada do mercado, o que fez baixar os preços no mercado interno.

A reforma da PAC que se seguiu passou a atribuir subsídios às produções agrícolas para que os rendimentos dos agricultores não baixassem.
Os países em desenvolvimento contestaram na OMC o direito da CEE a subsidiar as produções agrícolas, o que levou a nova reforma da PAC e a abandonar a subsidiação em função das quantidades produzidas com atribuição de subsídio fixo por hectare, sem exigir que a terra seja cultivada, o que foi feito em função das médias de produção dos últimos anos, sendo, no essencial, estes os subsídios actualmente em vigor, com a designação de R.P.U. (Regime de pagamento único).

Está agora a preparar-se a próxima reforma da PAC. Os países em desenvolvimento, conhecidos por países emergentes, que têm cada vez maior peso económico e político, (Brasil, China, Argentina, Índia e outros) opõem-se, no âmbito da O.M.C., a que a União Europeia mantenha a subsidiação agrícola descaracterizada sob a forma de RPU (regime do pagamento único) e resista à extensão aos bens agrícolas do regime de comércio internacional em vigor no âmbito da OMC para os bens industriais e os serviços.

A discussão desse assunto foi aberta há vários anos em Doha, cidade dos Emiratos Árabes, e continua aberta.

Os países emergentes acabarão por impor a sua pretensão. Na perspectiva dessa inevitabilidade e do referido recentemente pelo Comissário Europeu para a Agricultura resulta que, com a próxima reforma da PAC, acabará o R.P.U. (subsídio em regime de pagamento único) devendo estabelecer-se medidas que garantam que a actividade agrícola conserve o meio ambiente, os recursos naturais, a biodiversidade, a diversificação de produções, fomente a inovação, a ocupação humana (emprego), apoie o investimento em meio rural.
Pretendendo-se isso da próxima reforma da PAC, ela é compatível com o fim dos subsídios e com a extensão aos bens agrícolas das regras de comércio internacional aplicáveis aos bens industriais e de serviços, não procedendo o argumento, frequentemente usado, da necessidade de obstar ao chamado «dumping» social, isto é do emprego, pelos países emergentes, de trabalhadores a que não são garantidos suficientes direitos sociais, que, se isso não for fundamento para restringir o comércio de bens industriais e de serviços, não se justifica que o seja para os bens agrícolas.

Há todavia que preservar a chamada soberania alimentar, a capacidade de cada país garantir à sua população o abastecimento, em quantidade suficiente, de alimentos básicos no caso de perturbação do comércio internacional que o impeça ou dificulte.
Para isso se poder garantir é necessário que as terras com capacidade produtiva se mantenham em condições de entrar imediatamente em produção, os agricultores que as gerem tenham conhecimentos técnicos suficientes e actualizados para produzir e disponham da necessária maquinaria agrícola.
Se, além disso, o país mantiver reserva alimentar básica permanente suficiente para alimentar a população durante um ano, nesse prazo é possível iniciar e concluir a produção de alimentos básicos (grãos, outros vegetais e carne de frango), para a assegurar no futuro.

A próxima reforma da PAC, se previr o pagamento aos agricultores dos bens sociais a produzir por eles que se considerar que, em cada território, de acordo com as características de solo e clima, devem ser produzidos (conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da biodiversidade, a ocupação humana e adequado emprego, que é o que se pode designar por humanização do território) garantindo-lhes condições de vida suficientemente niveladas com as da população urbana, não precisa, nem deve, atribuir-se-lhes subsídios, porque os agricultores, se produzem bens (ambientais e outros) de interesse social, devem ser remunerados por isso com justiça e não subsidiados como se fossem grupo social a viver de esmolas, ou de proprietários de terra, que, só por o serem, devam receber renda fundiária paga pelo poder público.

Essa remuneração a pagar aos agricultores pelos bens sociais que produzirem terá que ser necessariamente variável de região para região de acordo com as características de solo e de clima e dos objectivos pretendidos e contratados pelo poder público quanto a conservação do meio ambiente, dos recursos naturais, da paisagem, da biodiversidade e de ocupação humana, e o seu pagamento ser feito sem burocracias complexas, em tempo, ficando apenas dependente da área gerida, grande ou pequena, e da obrigatória, prévia, efectiva, isenta e atempada verificação do cumprimento dos objectivos contratados, com redução proporcional ao grau de eventual não cumprimento.

A formação e actualização profissional dos agricultores e o seu equipamento com máquinas agrícolas terá que ser objecto de adequados mecanismos de garantia e de compensação, tendo também em conta as características de cada região quanto a clima, solo e potencial uso.

Este tipo proposto de reforma da PAC garantirá que todos os agricultores, independentemente da dimensão do terreno que gerirem e sem imposição das condições que actualmente tendem a excluí-los, como são as áreas mínimas, a exigência de contabilidade organizada e semelhantes, recebam o pagamento dos serviços que com a sua actividade prestarem à comunidade.

Com isso pôr-se-á fim à actual injustiça de os subsídios agrícolas pagos pela PAC serem recebidos quase exclusivamente pelos grandes agricultores independentemente de cultivarem ou não a terra.

Estes propostos objectivos para a próxima reforma da PAC poderão garantir boa preservação do ambiente, da paisagem, da biodiversidade, das águas superficiais e subterrâneas, a ocupação e humanização do território rural, a capacidade de atrair população urbana que cada vez mais aí procura tranquilidade ou o regresso às raízes rurais familiares, antigas ou recentes, e não impedirão que cada agricultor, para além de assegurar a produção dos bens ambientais e culturais de interesse social por que for pago, produza o que entender nas terras por ele geridas, sem que por isso deva receber subsídio, garantia, ou outra compensação senão o preço que obtiver no mercado.

Essas produções tenderão a ser as economicamente mais viáveis no solo e no clima da exploração agrícola e mais facilmente colocáveis no mercado, incluindo no de proximidade (aldeia e centros urbanos próximos).

Portugal tem condições favoráveis para competir na produção de vinhos, fruta, hortícolas de estufa, azeite, madeiras para pasta de papel e cortiça e, na média distância (Portugal e Espanha), com leite e carne, passando a ser de maior interesse as produções segundo técnicas de preservação ambiental.

A próxima reforma da PAC não poderá deixar de apoiar investimentos no meio rural para melhorar as condições de vida nele e potenciar a capacidade de atracção de gente urbana para aí se fixar e de visitantes.

Se, no essencial, a PAC for reformada como se propõe, tornará disponível para a população europeia alimentos da melhor qualidade (se ela for devidamente fiscalizada), produzidos na União Europeia ou importados donde se produzirem ao melhor preço, do que resultará benefício para a sua população, melhorando a competitividade da economia europeia.

Convém que os partidos representados na Assembleia da República e no Parlamento Europeu discutam em Portugal, na Assembleia da República, a melhor defesa dos interesses de Portugal para a próxima reforma da PAC no Parlamento Europeu, que não colidam com os dos restantes países, não esquecendo que os dinheiros da PAC destinados aos agricultores que até agora têm chegado a Portugal têm beneficiado sobretudo as grandes explorações agrícolas do Alentejo e do Ribatejo. Ao norte e ao centro do país pouco desse dinheiro chega. É necessário que, com a próxima reforma, a PAC contemple todos os agricultores com equidade.
Essa discussão na Assembleia da República impõe-se por a política agrícola nos países da União Europeia sempre ter dependido mais das decisões tomadas em Bruxelas do que das tomadas internamente por cada país membro.                            

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