segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A atitude dos EUA e da UE em relação ao Irão

A atitude dos EUA e da UE em relação ao Irão tem paralelo com a que foi adoptada em relação ao Iraque
 António Bica

            As últimas eleições presidenciais no Irão mostraram que o país está política e socialmente activo. A população, especialmente a que cresceu sob a República Islâmica do Irão que sucedeu em 1979 à ditadura do Xá Reza Pahlevi controlada pelos EUA, é hoje muito mais instruída. Com a república islâmica o Irão tem nova constituição na linha da do regime constitucional que em 1953 a CIA derrubou impondo o Xá como rei absoluto e por via dele assegurando o controlo do petróleo iraniano.
            Ao contrário do que a máquina de informação global dos EUA em que muitos judeus têm poderosa influência quer fazer acreditar à opinião mundial, o Irão não é uma ditadura militar. É regime republicano constitucional embora confessional islâmico xiita, em que o poder a todos os níveis é conferido por eleições periódicas, incluindo dos membros do Conselho Religioso que elegem entre si o supremo líder religioso.
            O Conselho Religioso tem no Irão função política constitucional semelhante
à que teve em Portugal o Conselho da Revolução a seguir ao 25 de Abril, garantindo que os princípios e os valores políticos defendidos pela revolução não sejam subvertidos. E as mulheres não são discriminadas no Irão, sendo maioritária nas escolas, incluindo nas universidades, e em várias profissões. A situação política e social no Irão é muito mais avançada do que a existente na generalidade dos países islâmicos sunitas que os EUA protegem, como a Arábia Saudita, o Egipto e o Paquistão. O Irão está a avançar política e socialmente em consequência do desenvolvimento do ensino generalizado em todos os graus a toda a população e do consequente desenvolvimento económico. Esse desenvolvimento gera tensões sociais e políticas com os consequentes avanços e recuos.
            Agora parece estar o Irão mais progressista em fase de recuo. As forças mais conservadoras do ponto de vista religioso e político estão a procurar refrear a evolução.
            Os EUA e a União Europeia não parecem estar a entender o processo político do Irão, seguindo as intransigentes posições de Israel, que dispõe de numerosas bombas atómicas e defende a destruição por bombardeamento das instalações nucleares que o Irão sempre afirmou destinarem-se a fins pacíficos em conformidade com o Tratado Internacional de Não-Proliferação Nuclear que subscreveu.
            Os últimos desenvolvimentos do caso respeitam ao uso de material nuclear para fins médicos, sobretudo para tratamento de tumores cancerosos, de que o Irão não dispõe. Porque é necessário que para isso o material nuclear seja enriquecido a 20%, muito longe dos 90% necessários para a produção de bombas atómicas, percentagem essa superior à necessária para produção de electricidade, o Irão propôs que lhe fosse fornecido, em pequenas quantidades, em troca de material nuclear enriquecido a 3,5% que tem estado a produzir em proporção das pequenas quantidades enriquecidas a 20% necessárias para fins médicos.
            Como os EUA e a UE querem privar o Irão do material radioactivo de que dispõe propuseram em 21 de Outubro de 2009 que o Irão enviasse previamente 75% do material radioactivo enriquecido a 3,5%, para só depois receber material radioactivo enriquecido a 20% se provasse sem lugar a dúvidas não ter intenção de o utilizar para fins militares, prova que, sendo de facto subjectivo e negativo, é impossível de fazer. O Irão não aceitou as condições e em 7 de Fevereiro de 2010 iniciou procedimentos para obter material radioactivo enriquecido a 20% para ser usado em fins médicos. Seguiu-se a habitual negociação liderada pelos EUA e a UE para impôr no Conselho de Segurança da ONU sanções contra o Irão. A Rússia, provavelmente a troco de concessões estadunidenses e europeias, poderá, embora não seja certo, viabilizar as sanções. A China parece estar mais relutante mas não é impossível que ceda em troca de concessões que se lhe afigurem vantajosas. Israel, que sempre se recusou com o beneplácito dos EUA a cumprir todas as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, para restituir aos palestinianos a terra que ocupa, assiste ao desenrolar das pressões políticas para enfraquecer o Irão, porque o Irão no mundo islâmico, apesar de religião xiita e de os palestinianos serem sunitas, é o mais destacado e firme defensor do direito de os palestinianos viverem na sua terra, a Palestina, livres de Israel.
            A atitude dos EUA e da UE em relação ao Irão na questão da energia nuclear tem paralelo na que foi adoptada pelo presidente Bush em relação ao Iraque no início da década de 2000 – provem que não têm meios militares de destruição maciça para não haver guerra. Sendo a prova negativa, os EUA e a Inglaterra sempre a consideraram insuficiente, que o que queriam era ocupar militarmente o Iraque e apropriar-se do seu petróleo. Veremos o desenrolar no Irão dos próximos acontecimentos, embora se possa ter como muito provável que nem os EUA atacarão militarmente o Irão nem autorizarão Israel a fazê-lo. A amarga lição da insensata guerra contra o Iraque parece ter sido aprendida.

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