quinta-feira, 7 de abril de 2011

As próximas eleições

As próximas eleições, o PSD e o chamado PEC 4

António Bica

Em 11 de Março de 2011 não aconteceu só o terramoto do Japão, mas também em Portugal terramoto político com epicentro em Bruxelas. Nessa sexta-feira o primeiro ministro Sócrates negociou as medidas restritivas da despesa pública a aprovar com o orçamento do Estado para 2012, como foi recentemente previsto na União Europeia para todos os países que a integram para garantia de respeito por cada país das medidas fiscais de contenção do défice orçamental e da dívida pública.
Cavaco Silva, no discurso de posse dois dias antes, em 9 de Março, ressentido com o apoio do PS a Manuel Alegre seu adversário na eleição presidencial, tomou nisso pretexto para atacar o governo.
Quando Sócrates regressou de Bruxelas e anunciou que negociara o chamado PEC 4, Cavaco não se conteve e disparou contra ele. Queixou-se de que o primeiro ministro o não informara previamente dos termos das negociações em Bruxelas para as medidas fiscais restritivas no orçamento de 2012.
Foi o primeiro tiro. O PSD, desejoso de suceder ao PS em Belém, mas pensando abrir as hostilidades pelo verão, não deixou de responder ao sinal, anunciando opor-se ao PEC 4 negociado em Bruxelas pelos pesados sacrifícios que impunha aos cidadãos e por não ter sido previamente negociado no âmbito parlamentar, seguindo, neste argumento, a queixa de Cavaco: O governo não me informou.
Este argumento de falta de negociação interna prévia não é pertinente. Os países que integram a zona euro, ao ter aceitado negociar no início de cada ano, em Bruxelas, as medidas de contenção dos seus orçamentos de Estado para o ano seguinte, abdicaram do direito de definir  nos seus parlamentos as grandes linhas de controle orçamental por terem que ser definidas por negociação  prévia entre o governo de cada país e Bruxelas, no início do ano precedente ao do orçamento, portanto antes de o orçamento de Estado ser discutido em cada parlamento nacional.
O PSD, na sequência do anúncio da rejeição liminar no Parlamento do PEC 4 acabado de ser negociado por Sócrates em Bruxelas, não admitiu a substituição, em sede parlamentar, de algumas das suas medidas restritivas por outras que não deixariam de ser aceites por Bruxelas desde que o impacto orçamental fosse semelhante.
Alguns cidadãos de esquerda, embora de opinião com pouco ou nenhum acolhimento nos grandes órgãos de comunicação social, defenderam e esperaram que o PCP e o BE se abstivessem em conjunto na votação do PEC 4, evitando, sem se comprometerem com as medidas do PEC4, a queda do governo com imediata retracção do mercado na compra de dívida pública portuguesa  em consequência da rejeição liminar do PEC 4 acabado de acertar em Bruxelas, procurando, em contrapartida, negociar as medidas dele socialmente mais gravosas por outras menos duras.
Mas a provavelmente ilusória ideia do PCP e do BE de que, com a imediata queda do governo do PS, virão a beneficiar de significativo acréscimo de votos na eleição parlamentar sequente, não os deixou prever que poderão não alcançar suficiente votação, e o PSD e o CDS em conjunto poderão vir a formar governo com apoio parlamentar maioritário. Nesse caso ao socialmente gravoso PEC 4 sucederá outro pior.
Não demorou muito que o PSD mostrasse que com a sua rejeição do PEC 4 não quis mais do que responder ao ataque do Presidente da República, informando que respeitaria os objectivos do PEC 4 mas substituindo algumas medidas por outras. E, externamente, em 30 de Março de 2011, no jornal Americano Wall Street Journal, mostrou que por vontade do PSD as medidas orçamentais restritivas serão mais duras, esclarecendo nesse jornal a razão do voto contra o PEC 4: «Votámos contra, não porque se foi longe demais, mas porque não suficientemente longe.»
Internamente, em Portugal, o PSD, além de medidas avulsas demagógicas na procura de captação de votos nas próximas eleições como o fim de justa e necessária avaliação dos professores, procurou que o governo PS, em consequência da negativa reacção do mercado financeiro internacional à rejeição na Assembleia da República do PEC 4, chamasse a intervenção financeira europeia com o Fundo Monetário Internacional, que, quando é instado a intervir num país, assume a função de sombra do Ministério das Finanças impondo medidas financeiras draconianas.
O governo tentou evitá-lo, fundamentando-se com lógica em que, além de ser governo de gestão, tendo sido rejeitadas as medidas do PEC 4 negociadas em Bruxelas capazes de assegurar a estabilidade do mercado financeiro internacional, há que deixar ao governo que for empossado na sequência da próxima eleição parlamentar a negociação de medidas de restrição orçamental que substituam as rejeitadas, recusando-se a repetir a conhecida rábula histórica de Egas Moniz de corda ao pescoço a apresentar-se diante de Afonso VII de Leão e Castela  oferecendo-se para ser enforcado em vez de Afonso Henriques que faltara à palavra dada.
A rábula de Egas Moniz pegou em tempos cavalheirescos medievais. Mas neste tempo de economia monetarista especulativa, os bancos portugueses anunciaram, em 5 de Abril, que não comprariam os títulos de dívida pública portuguesa em próximas vendas deles. O governo vergou-se à imposição dos Bancos e em 6 de Abril anunciou que vai pedir o apoio financeiro europeu e do Fundo Monetário Internacional, que seguramente irão impor medidas orçamentais mais restritivas do que as previstas no PEC4. Entrarão em Portugal fazendo maior estrago social que o rejeitado PEC 4.
Neste drama, não tragédia, Portugal, que já passou na sua história de quase 900 anos por apertos bem mais graves, não se afunda, mas o povo que vive do trabalho vai ver reduzidos os rendimentos.
A intransigente defesa pelo actual governo da Alemanha do valor do euro para salvaguardar a riqueza monetária em mãos alemãs calculada em mais de 1,5 milhões de milhões de euros em aplicações financeiras sobretudo na zona euro não autoriza a solução, classicamente seguida pelos países, de emissão de moeda na zona euro com a sequente inflação e correspondente redução do valor dos salários, pensões, rendas, aplicações financeiras e demais rendimentos fixos.
Como essa medida desvalorizaria cerca de 1,5 milhões de milhões de euros alemães aplicados em aplicações financeiras, o governo alemão quer que, em vez disso, sejam reduzidos nominalmente os salários, as pensões, o subsídio de desemprego e as demais prestações sociais, o que evitará a desvalorização dos investimentos financeiros dos bancos, das empresas e dos particulares alemães em consequência da inflação que a emissão de moeda geraria.
O governo do PS, em gestão desde a dissolução da Assembleia da República, tentou solucionar a necessidade de financiamento público por venda de títulos de dívida a prazo curto (entre um ano e dois), que têm maior procura a juros mais baixos, para que não se tornasse indispensável o recurso à intervenção da Europa e do Fundo Monetário Internacional durante os dois meses (Abril e Maio) de gestão corrente dos negócios públicos por este governo. Mas a subida dos juros desses títulos e a atitude dos banqueiros portugueses não deixaram caminho para outra solução senão a intervenção financeira da União Europeia através do Fundo de Estabilização Financeira e do Fundo Monetário Internacional.
Na campanha e pré-campanha eleitoral vamos assistir à habitual guerra política de imputação por cada partido aos outros, nunca também a ele mesmo, das nefastas consequências para o povo trabalhador das inevitáveis medidas restritivas orçamentais. Os cidadãos assistem e, submersos pela falácia dos argumentos e as dificuldades da vida, cada vez mais votam em branco ou nulo, ou, sobretudo as gerações muitos pequenas no 25 de Abril ou nascidas posteriormente, não cumprem o dever cívico de votar.
Esta consequência deve ser lida com atenção pelos partidos políticos e por todos os cidadãos que se preocupam com a causa pública. Principalmente em consequência da intransigente guerra política partidária depois do fim da primeira Grande Guerra  Portugal perdeu o regime democrático e passou por cerca de 50 anos de autoritarismo antidemocrático. Embora Portugal integre hoje a União Europeia, não sendo fácil as forças anti-democráticas assaltar o poder como fizeram em 1926, a perda de qualidade da luta política está a contribuir para Portugal estar a ser mal governado, que os partidos que adoptaram o neo-liberalismo (PS, PSD e CDS) pensam sobretudo em garantir a fidelidade da sua clientela distribuindo-lhe cargos e outros benefícios à custa do orçamento, e os outros, o PCP e o BE, posicionam-se mais como frente sindical do que como partidos procurando soluções globais mais justas e equitativas para a sociedade portuguesa sem deixar de procura fazer as reformas que levem à  eficiência e ao dinamismo da economia.

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